quarta-feira, agosto 6

Trabalhando na Holanda

No post do dia 1 de Agosto, a Silvia de Alkmaar comenta sobre as dificuldades dela no trabalho e pergunta qual o meu segredo para expor minhas idéias, entender os colegas.

Vou começar com uma colocação inicial, de suma importância para entender tudo o que vem depois.

Eu vivo em pânico. Acordo em pânico, passo o dia todo em pânico, vou dormir em pânico. É isso 24 horas por dia. No começo era um panicozinho simples, a velhinha do mercado desatar a falar comigo em holandês e eu ficar com cara de pastel, a voz misteriosa da estação de trem dar um aviso importante e eu não entender e ir parar em Heerlen ao invés de Haarlen, de alguém numa entrevista de emprego dizer que eu sou uma burra por ainda não falar holandês, essas coisas... Na verdade, meu problema maior é esse medo estúpido de fazer papel de palhaço, de pagar mico. Aqueles que não estão nem aí certamente sofrem menos.

Quando comecei a trabalhar, o pânico triplicou. Nessa hora, foi importantíssimo trabalhar numa empresa super internacional, onde a minoria era holandesa, assim eu me sentia menos "ET phoned home" no que tange à língua, então o pânico era basicamente com as diferenças culturais. E como tudo é diferente aqui! São mais diretos nas negociações, mais honestos, mais disciplinados, quase sempre cumprem os prazos. De certa forma é muito mais fácil trabalhar com um europeu do que com um brasileiro, pelo menos na minha área. Mas o pânico constante nunca me deixou, eu é que aprendi a viver com ele, como se fosse um sapato apertado, sabe?

Fora as crises de pânico agudo, que me dão embrulho no estômago só de pensar. Entrevistas de emprego, programar tudo pra não se atrasar, roupinha apropriada, a espera na ante-sala com o envelopezinho do CV na mão... O exame de motorista, depois de quase 30 aulas. O teste de holandês para requerer a cidadania. Pânico, pânico, pânico.

Você fala sobre entender o que seus colegas falam. Se é o entender "linguísticamente falando", eu peço pra repetir em inglês, ou pergunto o que XXX quer dizer. Mas se é um conceito, uma colocação, eu digo "sorry, I didn't get that, what do you mean by XXX"? Na maioria das vezes, a pessoa estava só de bla bla bla e nem ela entendeu bem o que disse. Porque aqui também tem profissional falastrão, ô se tem.

O que aumenta esse pânico é SABER, não é nem achar, é SABER, que aqui na Holanda eu sou o azarão do turfe, quase uma aberração. Sou uma mulher numa montadora de veículos pesados: de 70 funcionários em compras, 4 somos mulheres. Sou a ÚNICA imigrante "não comunitária" - pra não dizer de país pobre: dos 70, tem tem um francês e eu de imigrantes. O nosso veículo pesado tem 3 produtos-chaves, o chassi, o motor, o cockpit: eu sou a responsável pelo cockpit. Por isso tudo eu vivo em pânico porque eu tenho que me esforçar extra para ser aceita pelos colegas, para provar que eu posso cuidar de um portfolio tão pesado, pra aprender mais rápido que o normal, tenho que provar, sem sombra de dúvidas, que mereço ter o que tenho e ter chegado onde cheguei. Pânico de falhar, pânico pânico pânico.

No meio desse pânico todo, o único momento em que eu me sinto de igual para igual, ou até melhor do que eles, é quando eu tenho que expor minha opinião, é quando eu tenho que explicar porque temos que comparar cotações, porque eu prefiro desdolarizar um valor, como eu planejo controlar o investimento de 20 milhões que vamos fazer no meu cockpit. Porque nessa hora, EU SEI. Não importa se eu falo inglês, holandês macarrônico, esperanto - EU SEI o que eu estou falando. E quando EU SEI, colega, sai debaixo, ninguém me segura.

O pai de uma amiga minha tem um ditado que resume bem minha situação: estou em pânico há tanto tempo que se de repente me vejo sem pânico, entro em pânico.

6 comentários:

Anônimo disse...

Pô, Adriana, na boa... Vale a pena esse pânico todo? Eu não güento não, cruzes! Também não sei que solução existe, se é que existe, até porque eu normalmente sou exatamente o oposto e só entro em pânico com coisas além do meu controle. Mas eu fiquei nervosa só de ler o post...

Anônimo disse...

Adriana...
Ja perguntei uma vez, acho que vc não viu.
Gostaria de saber que língua vc fala em que circunstância: Tipo, vc fala ingles ou holandes com seu marido? Vc fala ingles ou holandes no trabalho? Quando vc vai as compras? Médico? Correios? Quando vc debateu com o controlador do estacionamento...
Como é o esquema ai na Holanda? Existe precoceito quando nao se fala holandes ou o povo aceita na boa?
Acho que vale um post!
bjus

Anônimo disse...

Dãããã, já sei onde você trabalha...mas eu também não vejo o motivo de tanto pânico! Por uma lado esta energia é boa, mas por outro pode trazer muita preocupação à toa! Acho que você ja provou seu valor, agora é dar uma relaxadinha!

Ana disse...

Dri nao acho que a descriçao do que vc sente seja "pânico" porque o pânico paraliza a pessoa, e esse é longe de ser seu caso, o que vc tem é aquele nervosismo saudavel de antes de falar em publico, entrar numa sala de aula, essas coisas, é mais um aumento de adrenalina...que depois baixa, obvio que tem gente que nao suporta essa sensaçao, mas no nivel que vc fala é saudavel e até motivador.

Anônimo disse...

Yoga! :)

Anônimo disse...

Adriana...eu morando na Inglaterra e tb trabalhando para uma empresa internacional, tb tenho que provar que sei....entendo esse clima de diferença, mas para mim é saudável e é como uma ansiedade de aceitação e acertar sempre...um peso, mas que motiva e acelera o crescimento profissional.
Abraços
Nancy