Você quer trabalhar na Holanda? Então deixa eu te dar umas dicas.
Metade do país é “horácio”, manja o braço curto? Vai morrer se esticar o dedinho um pouco pra fazer o que não é serviço direto dele. E se você, que não é braço curto, fizer a cagada de tentar ajudar em algum assunto, o mico vôa pra sua mesa mais rápido que dizer “Zip me up Scottie”.
Já ouviu falar em “save face”? O holandês vai ir às profundezas do buraco negro pra “save face”, ou seja, pra não pagar um carão. Assumir que cometeu um erro, que esqueceu de algo? Jamé de la vie, ele vai arranjar mil e uma desculpas para não dizer “pisei na bola, desculpaê”.
Eles acham que o mundo tem que parar se eles ficam doentes. Temos um fornecedor holandês, empresa familiar, o dono tem uns 60 anos, foi operado há 6 semanas e deveria estar fazendo repouso, mas como pegou esse projetão na minha empresa e a empresa dele atrasou horrivelmente o projeto ( manja empresa que quer dar o passo maior que a perna? ), ele está lá na fábrica, no chãozão mesmo, ajudando a soldar, a cortar vergalhões de aço. Cada vez que eu ligo para checar o status do projeto, ele me repete a ladainha: estou me recuperando duma cirurgia, devia estar fazendo repouso, estou com dores, e mesmo assim estou fazendo o supremo esforço de tentar cumprir o contrato que eu assinei com você. E aí você pergunta: esse cara não tem um “second in command”?
Aí entra a lição numero três de como trabalhar com os brejeiros. O dono da empresa tem um filho que é sócio dele, um gerente de fábrica, um gerente de qualidade que é ex-funcionário da minha empresa, mas infelizmente nós ousamos desafiar a deusa furiosa das férias de verão, e se alguém trabalhar, vai queimar no fogo do inferno. O cara, doente, concordou em deixar esse povo todo ir de férias, não dava pra negociar um periodo alternativo com pelo menos um deles? O detalhe é que essa zique-zira já é conhecida desde abril, ou seja, não é que neguinho foi pego de surpresa.
E a próxima lição. Aí o senhor começa a fazer beicinho no viva a voz, diz que está emocional ( ik ben emotioneeeeel, echt emotioneeeeeel ) e a holandesada do lado de cá quase chora junto. Éramos 4, os outros 3 só no “coitadinho”, eu – que tenho um trabalho a fazer – respondi: vamos lá senhor fulano, vamos achar uma solução, dá pra trabalhar segundo turno, dá pra produzir no final de semana, dá pra contratar transporte com dois motoristas pra Espanha? – e o cara enxugou as lágrimas e disse (depois de repetir que devia estar em repouso) que ía lá falar com os empregados pra ver se eles concordam em vir no sábado. Quando deligamos estavam todos olhando pra mim como se eu fosse o capeta, eu sai da sala mas fingi que ía tirar uma xerox do ladinho e ouvi o véio de um outro departamento: meu deus, não tem consideração essa aí, esses estrangeiros não tem consideração por ninguém… mas isso é agora o que a empresa quer, desde que foi comprada pelos americanos ( em 1996! ) só esse tipo de gente sobe aqui…
Na boa, fazer negócios com empresas pequenas e médias holandesas é uma bosta. Fuja! É sempre assim, tudo muito amador, tudo muito pessoal demais. Podem falar do que for dos alemães, mas quando eles pisam na bola, ligam pra informar já com um plano B, com tudo organizado, não tem tarde, não tem fim-de-semana, não tem férias.
Ai meus sais… Já me chamavam de “Iron Lady”, agora serei “the Iron Bitch”, se é que já não me chamam disso a muito tempo…
3 comentários:
Cut Throat Bitch (adorava qdo o House MD chamava aquela loura assim!).
Ri, ri muito porque é bem assim mesmo. Eles não assumem nada e se bobear jogam a culpa nas costas da gente. Fiquei imaginando a cena na hora da reunião...dramalhão mexicano. Agora queria saber se a situação fosse inversa, se o forncedor fosse um estrangeiro, aí sim ele seria chamado de incompetente. No entanto, antes ser chamada "the iron bitch"!
Estes dias li um e-mail do trabalho do marido onde uma pessoa passou e-mail pra empresa TODA dizendo que tinha caído da escada e que estaria em casa. O outro que comeu não sei o que, estava passando mal e ficaria em casa. Precisava dos detalhes sórdidos??? Não, né? hahah Fico boba! rs
Adriana, faz mais de um ano que leio seu blog mas nunca comentei, preguiça de me cadastrar rsrsrs adoro os seus posts e a maneira como expõe os assuntos. Moro na Holanda também, e as vezes penso sobre essas "singularidades" holandesas rsrsrs acho que nunca vou me acostumar!
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