quarta-feira, setembro 5

Meio Carro

No ano 2000, depois do fim do meu noivado de 4 anos, me dei de presente uma viagem pela Europa. Sozinha. Mochilão.

Foi um mochilão com um budget mais confortável do que a maiorida dos mochileiros, eu tinha grana pros passeios, pra comer em alguns restaurantes legaizinhos, mas fazer tudo isso e por cima pagar hotel, sozinha, não dava. Acabou sendo uma experiência fantástica, mas não é pra qualquer um.

Comecei por Londres, eu cheguei lépida e faceira, mas a mala não chegou! Como fazer mochilão sem o mochilão? British me deu 100 libras até encontrarem minha mala, mas demoraram 3 dias! Estragou bastante meus primeiros dias em Londres, como conseguir aproveitar sem saber se eu teria roupas no dia seguinte? No terceiro dia eu fui a Heathrow, chorei, me deixaram entrar num galpão do aeroporto com literalmente milhares de malas, completamente em pânico, em dois dias eu tinha que seguir para Amsterdam, e eu fucei uma hora até achar minha mala, que graças a Deus era azul claro, fácil de achar.

Gente, fiz tanto erro de planejamento! Mas também, quase não existia informações na internet…

Fiquei 3 dias em Amsterdam e olhe o programa do terceiro dia: ir para Schiphol, eu tinha que voltar a Londres, onde tinha deixado minha mala, cheguei em Heathrow, fui pro albergue perto da St. Paul cathedral, paguei a tal mala, corri praquele maledeto aeroporto City, e é claro que perdi o vôo. Peguei um mais tarde para Paris. Essa passagem foi de graça, ganhei numa promoção da British. Cheguei em Paris morta, odeio aquele aeroporto, levei um tempão pra pegar a mala e sair daquela droga, no ônibus interno que leva ao terminal rodoviário, esqueci minha bolsa, com todos os documentos, travellers, tudo tudo tudo. Achei que minha viagem fosse acabar ali. O motorista francês tinha vista uns italianos pegando a bolsa abandonada e falando que levariam para o achados e perdidos, fui correndo pra lá, nada. Procura aqui, procura acolá, já estava indo pra polícia do aeroporto pra dar queixa e poder ir ao consulado brasileiro emitir novo passaporte, quando chegam os italianos com a minha bolsa. Na alegria nem questionei a mais de uma hora que os italianos ficaram com ela, só abri, vi que o passaporte e os travellers estavam lá, nada mais me importava. Convidei os italianos para pegar um taxi, eu pagaria, convidei para um jantar, eles não viam a hora de me ver pelas costas, eu só achei que era educação, não queriam dar trabalho. Fui pro albergue, que eu adorei ( D’artagnan ). Na manhã seguinte, recuperada do susto, saí pra turismar e cadê minha agenda eletrônica ( onde estavam o número de todas as reservas ), cadê minha câmera com todas as fotos de Londres e Amsterdam? Os maledetos levaram, e também o relógio que eu emprestei da minha mãe ( odeio relógios, nunca tive um ). Fui num carrefour, comprei uma camera nova, ainda bem que tinha uma em promoção ( e durou aaanos a bichinha ), àquela altura, tudo era alegria, só de pensar que no dia anterior eu quase tive que ir pra polícia!

Ali em Paris, joguei fora 1/3 das minhas roupas, é só quando você carrega uma mala de 25 quilos pra cima e pra baixo ( e olha que não fui de mochila não, minha mala tinha rodinhas ) que você vê que idiotice que é carregar tantos pares de calças, e sapatos…

Fui pra Suíça, dormi pela primeira vez no trem-leito, amei ( o trem e a Suíça ). Fui pra Veneza, onde conheci um casal em lua de mel super legal e eles me fizeram dividir a gôndola – todo mundo feliz. Dali, fiz o roteiro exatinho que eu e o ex-noivo planejamos pra lua de mel: Firenze, 5 Terre, Pisa, Roma, Napoli. Estiquei pra Costiera Amalfitana. Fiquei num albergue em Atrani, a 700 mtrs de Amalfi, o albergue não era o oficial do Hostelling International e era bem ruim. Tinha um quarto para as mulheres, e tinha uma moça só além de mim – o quarto era enorme. Naquela noite só notei que ela chegou bem tarde, de madrugada, acordei e ela estava dormindo, fui passear e quando voltei, o dono me chamou com um policial: teria eu visto algo de anormal com a moça? Falei que ela tinha chegado bem tarde, só isso. Naquela manhã ela não levantou, tentaram acordá-la e ela estava morta. Ninguém sabia do quê.

De lá segui pra Taormina, na Sicília, no trem noturno. O legal desse trem é que ele acopla numa balsa e flutua até a Sicília. Um senhor dividiu a cabine comigo, dormi na janelinha, ele na porta, muito educado. O albergue de Taormina era muito legal, de novo eu estava sozinha no quartão enorme. Dois casais alemães estavam num hotel chiquérrimo ali perto e deixavam os filhos, 6 rapazes, no albergue. Achei estranhésimo. Amei Taormina.

Voltei pra Napoli, peguei um avião pra Barcelona. O albergue era lindo, no bairro gótico, amei. Bem na chegada conheci a Jack, até hoje nos correspondemos. Fomos dançar de noite, fomos comer pan con tomate… Engraçado, foi ali que deixei a carga pesada do noivado falido pra trás, tirei um peso dos ombros.

Segui pra Sevilha, de novo trem noturno. Dei Voltarem pra uma senhora no meu vagão – ela chorava baixinho de dor no joelho – e o alívio foi tanto que ela me comprou um pacote completo de café da manhã. Fiz amizade com duas mexicanas e fui curtir a noite com elas. Conheci um espanhol bem típico, malandrão, até o nome era de novela: Chico. Hahahaha. Dei umas voltas com ele, reencontrei as meninas, e vi que uma dela não conseguia tirar os olhos dele. Fui educada e segui viagem. Anos depois a tal mexicana estava morando junto com ele – conversávamos sempre por ICQ.

Segui pra Portugal. Em Lagos conheci o cara mais lindo e mais chato do mundo. Ele parecia ter uns 25 anos, tinha 42 – o que pra mim, na altura dos meus 26 anos, parecia o Matusalém. O cara levou um pé da esposa, foi mochilar na Europa. Perdeu 30 quilos na viagem – manja o gordinho que vira gatão e se acha? Mas então. Ele tocava violão na praça pra juntar dinheiro, sério. Quando peguei o trem pra Lisboa, quem tava no trem? O cara! E ele foi conversando… todo metido a hippie, natureba, surfando a onda… ele tinha me pedido dinheiro emprestado pro lanche no trem, me pagaria em Lisboa, esperei o cara entrar no ATM da estação e sumi, entrei num táxi e gritei corra! Cara chato. Amei Lisboa.

Peguei um vôo pra Carcassone. Fiquei no albergue que fica dentro das muralhas, fenomenal. Choveu muito, eu tomei muita chuva, dividi Cassoulet ( acho que esse era o nome daquele cozido com vários tipos de carne ) com uma turma do albergue num restaurante próximo, bebendo vinho e contando histórias de viagem. No dia seguinte, antes de seguir viagem, comi uma suculenta sopa de cebola que jamais vou esquecer, com aquela fationa de pão com queijo derretido em cima. Diliça.

Segui de trem pra Paris, minha última parada. Eu vi Paris no começo de setembro e na metade de outubro – mochilei 42 dias, que diferença! Amei das duas vezes, e foi uma cidade que nunca tive vontade de conhecer. Comi o melhor doce da minha vida, o Napoleon, numa patisserie perto do Champs Elysée, de bairro, baratésima. Não resisti e comi mais um. E levei mais um pro hotel, que comi mais tarde.

Voltei pro Brasil outra pessoa. Tinha visto o velho mundo. Tinha conhecido nova gente. Tinha chorado muito – no roteiro italiano que devia ter sido minha lua de mel e tinha beijado novamente depois de 4 anos com a mesma pessoa.

No aeroporto de Paris me deram uma revista que tinha uma matéria sobre as técnicas de operação no estômago, e foi alí que surgiu a idéia que mudou minha vida.

Quando voltei, meu pai comentou: você gastou “meio carro” e não tem nenhum bem pra mostrar pelo dinheiro que jogou fora. Ele não entendeu – não entende até hoje – que nenhum bem material vale todas as experiências que aquela viagem me deram.

Voltei pra maior parte dessas cidades com o Bart, num esquema diferente, mais calmamente, com meu companheiro de aventuras do lado. Cada uma dessas capitais ainda me dá friozinho na barriga. Estou agora decidindo se passo 5 diazinhos em Roma ou em Lisboa, ô decisão difícil. Podem deixar seu voto!

12 comentários:

Eliana disse...

hahaha a cena de vc fugindo do cara, escapando num táxi...hilário! hahaha

lilian moreira disse...

Olá Dri,
Que aventura maravilhosa, gostei muuito da parte do tiozinho pedir dinheiro emprestado... Muito boa.

Meu voto vai pra Roma.

Beijos.

Marcita disse...

Credo!!!! Essa tua viagem é digna de roteiro de filme!
Bom, eu voto em Lisboa porque Roma você já foi várias vezes e em Lisboa você pode conhecer GODOT - O GATO!

Bia disse...

Eh um verdadeiro "Comer, rezar e amar"! :)

Eu voto em Roma.. (para mim) sempre tive vontade de ir la, ja Portugal nao tenho muito.

bjs

Ana Célia disse...

Acho absurdo esse povo que acha que viajar é jogar dinheiro fora. Afe...

Viajar sozinha sempre rende boas histórias. Adorei seu relato =)

Mary disse...

Meu voto vai tambem para Roma :)

Alice disse...

Não sabia que vc tinha dormido com um defunto!
Para mim tanto faz Lisboa ou Roma.

pacamanca disse...

Roma, né, fia! Pra gente finalmente conseguir se encontrar, que tal?

Marcia disse...

Lisboa. Quero voltar à Itália, mas por algum motivo Roma não me encanta. Talvez precise voltar acompanhada para lá.

Adriana disse...

A MALA...passei pela mesma situação hahahahaha..ANTA que fui! Mas, a época sem net era bem mais dificil!

Adriana disse...

Aa..Lisboa...Portugal é meio HOME sweet Home pra mim! Amo!

Adriana disse...

A MALA...passei pela mesma situação hahahahaha..ANTA que fui! Mas, a época sem net era bem mais dificil!