Quando fui efetivada na GM, fui admitida numa célula com outras duas colegas. R. era dois anos mais velha e S. duas décadas mais velha. Logo nos entrosamos e nos tornamos amigas. Trocávamos confidências, segredos amorosos e até jogar Bingo juntas fomos.
S. sempre foi linda e apesar dos partidões que a cortejaram, cumpriu a promessa feita aos 8 anos de idade para a mãe: nunca iria se casar. Teve namorados, casos, flertes, mas por opção, nunca casou.
R. era a "casadoira", queria casar, ter filhos, trabalhar meio periodo ( ela era psicóloga de formação ), era super tradicional.
R. conheceu um moço que prometia, engenheiro civil com um ótimo emprego, morava no mesmo bairro chique que ela, gostava de ir aos mesmo lugares, o namoro engatilhou. E depois de 1 ano virou noivado e completaram 2 anos de namoro no altar.
O casamento dela foi a coisa mais fantástica que eu já tinha visto, e até agora não fui em nenhum que superasse. Apesar de ter acompanhado os preparativos, não estava preparada pro grau de sofisticação do evento. A igreja foi aquela chique dos Jardins, a noiva chegou num cadillac dos anos 50 raríssimo - cortesia do vice-presidente da GM ( o pai da R. era diretor da GM ). Foi no casamento dela que eu ouvi pela primeira vez a palavra "arautos", aqueles caras que tocam as cornetas quando a noiva chega - tinha 4 na porta. O vestido foi feito por um designer famoso e depois do casamento virou capa de revista, nunca vi um vestido tão sofisticado, chique mesmo. O jantar foi no melhor buffet de São Paulo. Na entrada tinha um lustre de 3000 cristais, e para manter a simetria, bem embaixo dele tinha um arranjo com 3000 rosas vermelhas. O serviço foi francês, a música foi ao vivo, tudo mais que perfeito.
A lua-de-mel seguiu os padrões do casamento: NY, Los Angeles e Hawaii.
Marcamos para ir visitá-la e conhecer a casa nova uns 15 dias depois que ela voltasse da lua-de-mel, mas ela acabou tendo um imprevisto e remarcamos. Aí uma tinha um compromisso, ou a outra, e passaram-se 3 meses sem que a gente conseguisse visitá-la. Um mês antes do casamento eu tinha mudado para um outro departamento e ela tinha ido para o Banco GM, logo as 3 comadres não se viam mais todos os dias...
Um belo dia liguei pra ver como estavam as coisas e remarcar de ver a casa dela e um choque: Adriana, não estou mais casada.
Ah, como assim? Na minha cabeça passou todo o namoro dos dois, o casal perfeito, o noivado perfeito, o casamento de rainha, a lua-de-mel de sonhos, como podia ser?
Chegando da lua-de-mel, ambos voltaram ao trabalho. R. tinha contratado uma empregada, que além de limpar a casa, antes de ir embora fazia arroz para "adiantar" a janta. Naquela primeira semana R. comentou com o marido, nossa que arroz gostoso que a empregada fazia, e o marido ficou furioso, gritou, xingou, como podia ela deixar a empregada cozinha, e se ela quisesse envenená-lo, envenenar os dois, pra fazer a limpa no apê?
R. achou doideira, um absurdo, mas pediu pra empregada não cozinhar mais. Duas semanas depois ele precisou ir para o RJ e pegou o carro dela, que era um leasing da GM pro pai dela e que só ela podia dirigir, e quando ela ligou pra ele pra pedir pra ele voltar e trocar o carro ( ele havia saído a minutos ), ele esbravejou que se alguém tentasse matá-lo na linha vermelha, com o Corsa ele não conseguiria fugir, ele precisava do Vectra.
E vários outros incidentes do mesmo tipo aconteceram. Até que um dia, ele liga em casa todo nervoso pedindo todas as senhas dos cartões de crédito que estavam em casa num cofre. Ela achou a ligação e o pedido estranho e perguntou o que estava acontecendo, ele só gritava: pega logo, pega logo. Quando ele chegou em casa, ensandecido, ele berrava que ele ligou sob a mira de um revolver, que os bandidos queriam as senhas pra ele tirar tudo o que fosse possível do caixa automático e que ela estava macomunada com os bandidos porque ela queria matá-lo. E foi encurralando-a na sacada, e trancou-a pra fora. Imaginem, julho, SP, de noite, no décimo segundo andar... Ela chamou e chamou o vizinho por horas, ele chegou tarde, ela ficou 2 horas naquela sacada, trancada, e quando saiu, fez uma malinha e voltou pra casa dos pais.
Um advogado foi imediatamente contactado, a bomba na família explodiu. No meio de todo aquele falatório, uma prima dele veio visitá-la e ela ouviu o inimaginável daquela quase desconhecida: o marido era um doente psiquiátrico. Ele foi diagnosticado na adolescência com uma forma de esquizofrenia, para ele alguém estava querendo matá-lo. Ele via "gente" seguindo-o, colocando coisa na bebida e comida dele, e paranóico, achava todos ao redor, mesmo os familiares, também queriam matá-lo.
A tal prima contou que ele tomava remédio e fazia terapia desde os 16/17 anos, que nas poucas vezes que ele parou com o tratamento os episódios voltaram, e que ele havia parado com o tratamento pouco antes do casamento, pois estava se sentindo tão bem que se achava "curado".
Long story short, eles se separaram, ele se recusou a voltar ao tratamento, ela ficou com medo dos "episódios" e o casamento acabou. Um dia antes do aniversário de casamento eles assinaram o acordo de divisão de bens e o divórcio. Oficialmente o casamento durou 364 dias.
Depois disso tudo, eu saí com a R. mais algumas vezes. Eu tinha acabado de operar, saí pra comprar roupas com ela, visitei o novo apartamento dela, lindinho de morrer ( e no mesmo bairro chiquérrimo dos pais ). Mantivemos contato por telefone, por e-mail, mas ficava difícil nos vermos tanto, eu trabalhando em São Caetano e ela em SP. A S. a viu mais uma vez, eu acho, mas mesmo assim mantínhamos contato.
Quando eu casei, convidei-a para o casamento, e ela não foi, não me deu um telefonema, não me mandou um cartão. S. também achou estranho, mas já tínhamos ouvido da R. que casamentos ainda a deprimiam muito, e relevamos.
R. nunca mais atendeu um telefonema da gente, ou respondeu um e-mail, e é até compreensível que não tenha me ligado, já que eu mudei pra cá, mas nunca mais nem tchans pra S., que se aposentou e está morando no litoral de SP.
Eu e a S. ainda mantemos contato, e é muito legal ver como nossas vidas se desenrolaram, mas sempre lamentamos o desaparecimento voluntário da terceira cajazeira.
Hoje foi o aniversário da R. e mais uma vez eu mandei um e-mail que vai permanecer não respondido, apesar de eu saber que foi lido. S. depois do terceiro ano não manda mais, diz que se a R. prefere se afastar, que assim seja. Eu fico triste, não por mim - que perdi uma amiga, mas por ela que depois de 10 anos ainda sofre com o breve casamento desfeito. Que sofre por ainda não ter encontrado o marido que ela tanto queria.
Eu, no lugar dela, teria me apegado a cada amigo, a cada pessoa que quisesse o meu bem, porque só assim a gente consegue superar essas imensas rasteiras da vida. Infelizmente ela pensa diferente, o que é triste para mim, que tenho saudades dela.
Ela nem sabe que eu tenho um blog, ela nem sabe o que foi feito de mim, mas deixo aqui registrado meus parabéns pela data e o desejo de que ela finalmente consiga encontrar a felicidade.
segunda-feira, abril 11
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6 comentários:
Dificl mesmo...tb tenho uma história semelhante à sua, uma grande amiga que de uma hora para outra sumiu do mapa. E nesse caso, eu nem soube se houve algum precedente. Pena mesmo!!
qdo me separei, depois de um muito longo namoro e um curtíssimo casamento, em circunstancias muito semelhantes as que voce contou, entrei no meu apto, tirei o telefone do gancho, avisei o porteiro que nao era nem pra tocar o interfone e fiquei 2 anos dentro do apto, saindo só uma ou 2 vezes por mes, pra pagar contas e ir ao supermercado. É dificil a gente sentir que nao pertence mais ao mundo que vc mesmo criou e compartilhou com seus amigos. Da vergonha, tristeza, dor.. a gente quer deixar tudo pra trás, se deixar pra tras... nem sempre se consegue... Um dia sua amiga faz as pazes com ela mesma, como eu fiz. Ai, ela vai voltar. Eu sei. Ja atravessei este deserto no escuro e para mim durou 7 longos anos esta travessia
Ai que difícil essa história né?
Acho que as pessoas colocam muita expectativa em um casamento, principalmente as mulheres, a vida é o casamento, idealizam demais.
O exemplo dessa sua amiga só reforça a idéia que a gente só conhece o outro MESMO com a convivência... Eu mesma passei por isso e aprendi que não adianta idealizar demais, e também não adianta se cobrar demais tipo "tenho que casar, tenho que ter filhos" isso é bobagem.
Se rolar rolou...
A minha história foi que viajei com uma colega de classe do ginásio que ha muito não via... No meio da viagem ela teve também um pirepaque e comecou a agir estranhamente, falar coisas sem nexo... e simplesmente sumiu no meio do itinerário. Pra encurtar a história, fiquei sabendo quando voltei que ela tbm tinha esquizofrenia controlada, mas os pais nunca aceitaram... ela tinha acessos esporádicos e infelizmente um foi comigo e estragou minhas férias...
NOssa que triste essa história. Me lembrei agora daquela atriz Thais Fersoza que casou e ao voltar na lua de mel anunciou a separação. Dizem que ela também amargou uma depressão fortíssima (pudera!).
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