sexta-feira, novembro 30

Home sweet home

Quando vivia no Brasil, morávamos em São Bernardo, num bairro bem próximo ao centro e pertinho de uma das saídas da Rod. Anchieta. Sempre que eu viajava por periodos longos, a “ficha” caía de que eu estava em casa quando o carro entrava na Anchieta, passava pelo Carrefour e pelo Colégio Regina Mundi, dalí tem-se uma vista da retona da Anchieta que entra em São Bernardo. Ah, estou em casa. Até hoje, passados quase 10 anos, se eu fechar os olhos, me transporto pra esse lugar, sei cada curva do caminho. Na primeira vez que voltei, dirigindo pelo centro de São Bernardo e repetindo o caminho para São Paulo, que tantas vezes fiz, novamente essa sensação de estar em casa, o deslumbre com o cérebro que relembrou as quebradas pelo Jardim Saúde. Essa sensação vai diminuindo a cada vez que volto. A cada vez, mais carros, mais gente, mais grafitti. Os olhos estranham tantos outdoors, fios elétricos, árvores mal podadas, lixo. Os olhos também observam que não há mais criança nos semáforos, aliás – são poucos os semáforos com vendedor de balinhas hoje em dia, aqueles que penduram as balas no espelho com um bilhetinho macambúzeo e quando o farol abre saem correndo pra pegar as balinha ou o dinheiro. Nunca mais vi cachorro de rua, e na Marechal em São Bernardo, não tem mais os tios pipoqueiros ou os tios vendedores de coquinho. Tá tudo muito diferente. E tá tudo ainda tão igual!

Nas duas últimas vezes que fui ao Brasil, já no finzinho, estava já naquele banzo ( odeio essa palavra ), mas era pela Holanda! No fim eu estava sentindo falta do meu pão de fatias do AH, de andar no centro de Eindhoven, do meu cinema Pathé e o cheiro do restaurante ao lado, das latinhas de sopa deliciosas que eu tanto amo Outro dia num workshop tinha uma foto aérea do centro de Eindhoven, e me deu aquele calorzinho bom de familiaridade, essa é agora minha casa! Vocês já sentiram isso?

Desde que eu mudei pra Holanda eu digo que quando eu me aposentar, quero fazer o que muitos Norte Europeus fazem: mudar pra Espanha. Estaria ainda morando num lugar seguro, mas mais quentinho, de preferência perto de uma praia, quem sabe na Espanha a família brasileira me visitaria mais, a língua eu já falo, a comida eu amo… mas será que quando o dia chegar, eu vou querer deixar a Holanda?

Outro dia uma das comadres me disse: eu falo holandês, não me sinto diferente de holandês nenhum, sou como eles. Eu não me sinto holandesa e jamais vou me sentir, apesar de agora já funcionar, fora ou dentro do trabalho, em holandês, tem sempre aquela piadinha que você não entende, ou aquela referência que você não capta, uma mania coletiva que você não tem. Mas hoje, diferente do começo, acho meus colegas holandeses extremamente generosos em me aceitar como o fazem, com graça, com paciência, com curiosidade pela minha “brasileirice” mas vejam, eu moro em Brabant, a Bahia da Holanda, onde tudo é mais relax, onde o povo é caipira e simpático, onde se tem o “brabantse quartierje” ( quinze minutos de atraso antes de qualquer reunião – ou seja, a neurose pelas horas marcadas é menor ).

A cada dia que passa eu crio mais raízes por aqui, e infelizmente, menos no Brasil. Ultimamente ando pensando muito na velhice, a nossa será bem solitária. Se eu me for antes, o marido se transformará num ermitão, e será feliz assim; se ele se for antes, terei uma velhice bem triste. Porque eu não sei viver completamente isolada, vou sentir falta de pessoas. Se voltar para o Brasil, vai chegar aquele momento crucial em que vou precisar de cuidados especiais e não terei ninguém pra ajudar. Por outro lado, o cuidado de velhinhos aqui na Holanda é ótimo, tudo bem que vão embolsar 70% da minha aposentadoria, mas estando no bico do corvo, vou precisar de dinheiro pra que? – mas estarei bem sozinha, se tiver sorte vou ser visitada pela Alice também velhinha ( ela prometeu! ) e pelos voluntários.

A sheicho-no-ie diz que tudo é projeção da mente. Vou projetar então que vou viver feliz e saudável numa cidadezinha espanhola simpática perto de uma praia bonita, vou ficar velhinha com muita saúde e lucidez, e quando a hora chegar, terei um aneurisma fatal que me levará em 2 segundos.

Ai, que papo light pra uma sexta-feira, né não? Bom fim de semana, pessoal!

7 comentários:

Eliana disse...

Seu parágrafo final está ótimo!hahaah Só nos resta saber se tudo será igual ao que é hoje pro velhinhos de agora! Se for..."tamo bem na fita"!rs Bom fim de semana.

S. W disse...

Eliana saudades do meu fretado parando no terminal no centro de Sao Bernô e eu subindo a Marechal. eu ainda tenho saudades daquilo tudo.

Monica Peres disse...

Agente se projeta onde é feliz.
Vc esta feliz onde está, que bom para vc!

Alias, qual a expressão para "caipira" em holandes?
hihihihihihih

bj

Mary disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mary disse...

sobre comadre... professora disse que so um nativo pode dar aula tao bem de linguas; falta algo aos estrangeiros

Marcia disse...

Não entendi o comentário da Mary, se for mesmo o que estou pensando, é uma bobagem tremenda, sou do ramo! Aliás nenhum dos melhores professores que tive de inglês e de alemão eram nativos, todos eram brasileiros. Só de holandês não posso dizer isso, porque só tive professores de holandês nativos. E caipira é mais ou menos " boeren", né.

Monica Peres disse...

boeren, tipo fazendeiro?
pensei que tinha uma gíria para 'caipira'!
obrigada mesmo assim!