domingo, janeiro 9

Por um mundo um pouquinho mais humano

Quem mora aqui fora tá sempre comparando "aqui é assim, lá é assado". Quando a gente vai ao Brasil, sempre perguntam: como se faz isso lá?

Li uma matéria francesa sobre o governo do Lula e os desafios do governo Dilma e eles diziam que no Brasil a questão da saúde são duas realidades em paralelo: a de quem pode pagar e a de quem não pode.

Enquanto eu vivi no Brasil tive o que era na época, o melhor convênio médico do país. E agora, vejo a minha mãe, que está no extremo oposto, ou melhor, só não está no extremo oposto porque de uma forma ou outra ela ou nós, os filhos, bancamos o tratamento particular.

Nessa última ida ao Brasil eu pensei que talvez a medicina-robozinho da Holanda é que esteja certa. Essa medicina, toda cheia de estatísticas, e de regras, e de prazos, iria garantir a minha mãe o direito de ir a um médico razoável, fazer seus exames numa policlínica boa e de fácil acesso ( lá em SP cada hora minha mãe tem que ir pra um lugar mais difícil que o outro pra fazer exames, e ficar indo de um lado pra outro com dor não é fácil ), iria sair do consultório médico com seus remédiozinhos na bolsa sem custo ou com custo mínimo e ao precisar de cirurgia iria utilizar um lindo e aparentemente muito eficiente hospital ( o Hospital aqui de Eindhoven é ótimo, dizem ).

Ninguém iria perguntar pra ela se ela está se sentindo bem depois do exame de sangue e oferecer um suquinho de laranja, ela não teria direito a um acompanhante quando fizesse cirurgia, e claro que estariam acompanhando o desenvolvimento da velhice dela em um chart estatístico de algum bureau qualquer. Mas bem, como diz sei lá que político holandês, outro país, outros costumes.

Desde segunda feira passada estou com o que parece ser a garganta inflamada, febre e tosse. Esperei uma gripe pior vir, mas ficou assim mesmo. Não precisei ir a médico algum, eu me auto-paracetamolizei. Faz quase uma semana, e nada melhora, só piora. Continuo tendo essa febre que vai e volta, a tosse está pior, a garganta também parece bem irritada, mas já não era pra ter melhorado? Sem conseguir respirar direito, e com a capacidade pulmonar de uma abelha ( até subir as escadas está difícil ), já cansada com essa dor no peito de tanto tossir, decidi marcar uma consulta essa manhã no posto médico, que é um posto que abre para atender casos mais ou menos de emergência, visto que os médicos de família só atendem em horário comercial.

Minha preocupação era apenas em que o médico visse minha garganta e me dissesse se é isso mesmo que está causando os sintomas, porque tá demorando demais pra curar! E eu fico pensando, estou voltando do Brasil, e se for alguma doença tropical? Ou então, e se eu penso que essa febre é da tal dor de garganta, fico mascarando sintomas com paracetamol, mas é alguma outra coisa?

Pôxa, eu não só só um amontoado de ossos, carnes e sangue, um robozinho orgânico, tem uma pessoa aqui dentro, que de vez enquando precisa ter sua mão segurada e seus nervos apaziguados, e precisa que outro ser-humano, que foi TREINADO para dar assistência médica a outro ser humano, olhe sua bendita garganta e diga: nossa, tá vermelha mesmo, tome paracetamol e um xarope também que logo vai passar, não se preocupe que mais que isso não é. Ou então que olhe a bendita garganta e diga: tá feia mas tá sem inflamação, a febre deve ser de outra coisa, vamos ver o que pode ser, mas não se preocupe que encontraremos a razão.

Mas não, claro que eu liguei e me disseram pra consultar minha médica amanhã. Claro que a menos que os sistemas do robozinho estejam obviamente dando pau, e que não haja esperanças de dar um boot e tudo voltar ao normal, que o robozinho tem mais é que ficar aqui quieta sem encher saco deles. Aliás a falha foi minha, que OUSEI ocupar o tempo deles com algo tão banal quanto uma dor de garganta que não passa.

O que aquele povo tá treinado pra fazer é uma borracharia de auto estrada: você vai lá com seu pneu furado, o carro sem poder andar, e eles remendam o pneu até você poder comprar outro. Não ouse aparecer com o pneu meio murchinho, espere ele furar de vez ou vá encher na bomba do posto, mas não encha o saco porque essa borracharia é muito, muito cheia, ocupada e importante.

Tenho certeza que se fizerem um campeonato mundial de bed-side-manner, holandeses ficam na rabiola. Seriam assim uns doutores House MD, sem a genialidade do mesmo, claro.

E assim fico eu, tossindo my lungs out, até a abertura do horário comercial.

E ó, pago 200 euro-paus pro mês de assistência médica, viu!

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